La Epoca Mercantilista Eli Heckscher Pdf 23
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As políticas mercantilistas partilhavam a crença de que a riqueza de uma nação residia na acumulação de metais preciosos (ouro e prata), advogando que estes se atrairiam através do incremento das exportações e da restrição das importações (procura de uma balança comercial favorável). Essa crença é conhecida como bulionismo ou metalismo.
O mercantilismo é um conjunto de ideias econômicas que considera a prosperidade de uma nação ou Estado dependente do capital que possa ter. Os pensadores mercantilistas preconizam o desenvolvimento econômico por meio do enriquecimento das nações graças ao comércio exterior, o que permite encontrar saída aos excedentes da produção. O Estado adquire um papel primordial no desenvolvimento da riqueza nacional, ao adotar políticas protecionistas, e em particular estabelecendo barreiras tarifárias e medidas de apoio à exportação.
O mercantilismo foi a teoria predominante ao longo de toda a Idade Moderna (do século XVI ao XVIII), época que aproximadamente indica o surgimento da ideia do Estado-nação e a formação econômico social conhecida como Antigo Regime na Europa Ocidental. Marca o final da proeminência da ideologia econômica do cristianismo (a crematística), inspirada em Aristóteles e Platão, que recusava a acumulação de riquezas e os empréstimos com juros (vinculados ao pecado da usura). Numa época que os reis desejavam possuir o máximo de ouro possível, as teorias mercantilistas buscavam esse objetivo e desenvolviam uma problemática baseada no enriquecimento, com base numa análise simplificada dos fluxos econômicos, em que, por exemplo, não se leva em conta o papel do sistema social.
Como agente unificador tendente à criação de um Estado nacional soberano, o mercantilismo contrapõe-se a duas forças: a primeira, mais espiritual e jurídica do que político-econômica, era constituída pelos poderes universais: a Igreja e o Sacro Império Romano Germânico; a segunda, de caráter predominantemente econômico foi o particularismo local, com a dificuldade que produz para as comunicações e a sobrevivência da economia natural (em determinadas zonas as rendas do Estado eram em espécie e não em dinheiro), enquanto a pretensão mercantilista era de que o mercado fechado fosse substituído pelo mercado nacional, e as mercadorias fossem substituídas por ouro, como medida de valor e meio de troca. O mercantilismo vê a intervenção do Estado como o meio mais eficaz para o desenvolvimento econômico.
Outra tendência do mercantilismo era fortalecer o poder do Estado no exterior, subordinando a atividade econômica a esse objetivo, e interessando-se pela riqueza enquanto servisse como base para isso. O liberalismo considerará a riqueza como preciosa para o indivíduo e, portanto, digna de ser atingida como um fim em si mesmo: se o particular não deve pensar em nada mais senão em enriquecer, é um fato puramente natural e involuntário que a riqueza dos cidadãos contribua para aumentar a riqueza do Estado. Por outro lado, para os mercantilistas, a riqueza privada é simplesmente um meio, e como tal fica subordinado ao Estado e aos seus fins de domínio.
Quase todos os economistas europeus dentre 1500 e 1750 são considerados atualmente como mercantilistas. Contudo, estes autores não se consideravam partícipes de uma única ideologia econômica. O termo só foi inventado em 1763, por Vitor Riquetti Marquês de Mirabeau, e popularizado por Adam Smith, em 1776. O termo mercantilismo foi criado a partir da palavra latina mercari, que significa mercantil, no sentido de levar a cabo um negócio, e que procede da raiz merx que significa mercadoria. De início foi usado apenas por críticos, como Mirabeau e o próprio Smith, mas foi logo adotada pelos historiadores. De fato, Smith foi quem primeiro organizou formalmente muitas das contribuições dos mercantilistas no seu livro A Riqueza das Nações.[6]
O mercantilismo em si não pode ser considerado como uma teoria unificada de economia. Na realidade não houve escritores mercantilistas que apresentassem um esquema geral do que seria uma economia ideal, tal como Adam Smith faria mais adiante para a economia clássica. O escritor mercantilista tendia a concentrar a sua atenção numa área específica da economia.[7] Somente após o período mercantilista é que estudiosos, como Eli F. Heckscher, integrariam as diversas ideias no que chamariam mercantilismo.[8] Heckscher vê, nos escritos da época, um sistema de poder político e, ao mesmo tempo, um sistema de regulamentação da atividade econômica, um sistema protecionista e um sistema monetário com a teoria da balança comercial. Contudo, alguns teóricos recusam completamente a ideia mesma de uma teoria mercantilista, alegando que esta dá "uma falsa unidade a fatos díspares".[9] O historiador do pensamento econômico Mark Blaug faz notar que o mercantilismo foi qualificado posteriormente como "bagagem incômoda", "diversão de historiografia", e de "gigantesco globo teórico".[10]
Até certo ponto, a doutrina mercantilista, em si mesma, tornava impossível a existência de uma teoria geral da economia. Os mercantilistas viam o sistema econômico como um jogo de soma zero, onde a ganância de uma das partes supunha a perda da outra ou, seguindo a famosa máxima de Jean Bodin, "não há nada que alguém ganhe e que outrem não perca".[11] Assim, por definição, qualquer sistema político que beneficiasse a um grupo faria dano a outro (ou outros), não existindo a possibilidade de a economia servir para maximizar a riqueza comum ou para o bem comum.[12] Aparentemente, os escritos dos mercantilistas foram feitos mais para justificar a posteriori uma série de práticas, do que para avaliar o impacto dessas práticas e determinar o melhor modo de implementá-las.[13]
Isto levou os mercantilistas a propor como objetivo econômico o de ter um excedente comercial. Era estritamente proibida a exportação de ouro. Os bullionistas também eram partidários de altas taxas de juros para animar os investidores a investir o seu dinheiro no país.
No Século XVIII foi desenvolvida uma versão mais elaborada das ideias mercantilistas, que recusava a visão simplista do bullionismo. Esses escritores, como Thomas Mun, situavam como principal objetivo o crescimento da riqueza nacional, e embora continuavam considerando que o ouro era a riqueza principal, admitiam que existiam outras fontes de riqueza, como as mercadorias.
Esta nova visão recusava a partir desse momento a exportação de matérias-primas, que uma vez transformadas em bens finais constituíam uma importante fonte de riqueza. Enquanto o bullionismo favorecera a exportação massiva de lã de Grã-Bretanha, a nova geração de mercantilistas apoiava a proibição total de exportar matérias-primas e propugnava o desenvolvimento de indústrias manufatureiras domésticas. Ao precisar as indústrias importantes capitais, no Século XVIII houve uma redução das limitações contra a usura. Como muito bem demonstrou William Petty, a taxa de interesse vê-se como uma compensação pelas moléstias ocasionadas ao prestador ao ficar sem liquidez. Um resultado dessas teorias foi a posta em prática das Navigation Acts a partir de 1651, que deram aos barcos ingleses a exclusiva nas relações entre Grã-Bretanha e as suas colônias, proibindo aos holandeses o acesso a certos portos para restringir a expansão dos Países Baixos.
As consequências em matéria de política interior das teorias mercantilistas estavam muito mais fragmentadas do que os seus aspetos de política comercial. Enquanto Adam Smith dizia que o mercantilismo apelava a controlos muito estritos da economia, os mercantilistas não concordavam entre si. Alguns propugnavam a criação de monopólios e outras cartas patentes. Mas outros criticavam o risco de corrupção e de ineficácia de tais sistemas. Muitos mercantilistas também reconheciam que a instauração de quotas e de controlo dos preços propiciava o mercado negro.
Por outro lado, a maior parte dos teóricos mercantilistas estavam de acordo na opressão econômica dos operários e agricultores que deviam viver com uma renda perto do nível de sobrevivência, para maximizar a produção. Uma maior renda, tempo de lazer suplementar ou uma melhor educação dessas populações contribuiriam para favorecer a folgança e prejudicariam a economia.[18] Esses pensadores viam uma dupla vantagem no fato de dispor de abundante mão-de-obra: as indústrias desenvolvidas nessa época precisavam de muita mão-de-obra e, ademais, isso reforçava o potencial militar do país. Os salários eram mantidos, portanto, em um baixo nível para incitar a trabalhar. As leis de pobres (Poor Laws) em Inglaterra perseguem os vagabundos e fazem obrigatório o trabalho. O ministro Colbert fará trabalhar as crianças com seis anos nas manufaturas do Estado.
Em efeito, não se pode falar de uma escola mercantilista, pois, para poder falar de uma escola deve existir uma série de características como a presença de um mestre que crie um pensamento que seja seguido pelos membros da escola, além de homogeneidade no pensamento. Assim, por exemplo, podemos falar da Escola Clássica com Adam Smith como epicentro do pensamento, ou seja, como mestre, e a afinidade entre os diferentes autores da mesma. No caso do pensamento chamado mercantilista não encontramos nenhum dos atributos necessários para identificá-lo com uma escola de pensamento.
O mercantilismo teve diversas interpretações ao longo do tempo. Desde Adam Smith até o presente sucedem-se explicações do que foram e significaram todos estes autores chamados mercantilistas. John Maynard Keynes, Gustav Schmoller, William Cunningham e o já mencionado Adam Smith, entre muitos outros, achegaram a sua perspectiva do mercantilismo. É assinalado particularmente Eli Heckscher que, influenciado pelos três últimos autores mencionados, reúne as interpretações destes para logo acrescentar a sua. Fala do mercantilismo do ponto de vista da sua política protecionista e as suas atitudes monetárias (como já refere Smith), como uma doutrina na construção do Estado (recolhido de Schmoller), como um sistema de poder (propugnado por Cunningham) e acrescenta a sua tese a estas quatro: descreve o mercantilismo como uma concepção social que quebrou com as formas, tanto morais quanto religiosas, que determinavam o comportamento dos agentes econômicos. 2b1af7f3a8